Papo de Mãe

Entrevista com Dra Dorli Kamkhagi sobre carreira x maternidade

pmadmin Publicado em 09/10/2009, às 00h00 - Atualizado às 03h05

9 de outubro de 2009


Olá!
Hoje pudemos conferir o programa sobre o conflito entre maternidade e carreira. Agora, segue a íntegra da entrevista feita pela repórter Rosângela Santos com a psicanalista Dra. Dorli Kamkhagi para o Papo de Mãe. RS: Carreira e maternidade. Conciliar isso é um dilema para mulher moderna? DK: Sim. É um grande dilema e as mulheres, muitas vezes, acabam fazendo opções que as deixam muito frustradas e machucadas. Elas acabam escolhendo abandonar algo muito precioso, que elas vinham se dedicando há muito anos, que é a carreira, em nome de ser uma mãe maravilhosa, em nome de um ideal, que é quase impossível. Ideal não existe. A gente tenta o que é possível – que é ser boa mãe, cuidadosa. Mas para isso acontecer, o sonho pessoal da mãe também é importante. Se este sonho for ter um trabalho que vai significar algo, se ela vai se sentir potente, ganhando dinheiro, sendo reconhecida, no momento em que ela abandona isso, nem sempre ela consegue se sentir feliz e realizada. RS: Como conciliar? DK: É difícil, mas é possível. Se ela não tiver expectativa altíssima de que tem que tirar nota 10 em tudo. Se ela puder entender que o filho pode ficar em alguns momentos sem ela, que o filho sobrevive com alguma ajuda (neste caso pode ser funcionária em casa, avó, escolinha, creche), que ela pode estar passando o melhor que ela tem na qualidade (que nem sempre significa quantidade) e que no trabalho dela, ela pode ser boa, mas não tem que ser perfeita. Se ela for buscar o máximo, ela acaba se exaurindo e adoecendo. Acho que é possível. Passei por esta experiência na minha vida. Tive que driblar algumas coisas. Em alguns momentos, eu precisei faltar no trabalho. Em outros momentos, tive que faltar em casa. Então, acho que a gente convive com a falta. Nem sempre se consegue estar em tudo e o filho aprende a valorizar que a mamãe está dormindo ou a mamãe está estudando e trabalhando. Ele aprende a ficar perto desta mãe que trabalha, estuda, desenvolve uma tarefa e é bom isso. Isso estrutura uma família. RS: Como administrar a culpa? DK: Analista, padre, confessionário… (risos). A culpa acompanha um pouco, mas a gente pode pensar em co-responsabilidade. Se essa mãe tem marido, se o companheiro entender que ela está fazendo o máximo, o melhor, e nem sempre ela vai dar conta de tudo, e que se ela escolheu estar neste momento no trabalho ou num seminário, isso é importante pra ela. Em outro momento, ela vai estar com filho no cinema, nas férias. Então, ela consegue viver amplamente cada momento. Sei que isso não é possível o tempo todo. Eu lembro de muitos momentos da minha vida em que era meio-dia, estavam todas as mães na porta do colégio e eu não estava. Isso quer dizer que eu era a pior? Não, não era a pior. Eu não podia fazer isso…Tem uma somatória nas relações. A vida entre filhos e pais é constituída de muitas situações. Vai se formando uma teia de amor, de carinho, de limites, de “minha mãe não é tão maravilhosa”. Pais precisam suportar a idéia de não ser tudo. A gente vive numa sociedade, numa cultura, que é como se os filhos não pudessem ter frustrações e é péssimo isso. E o que acontece? A gente vê tantos jovens infelizes, dependentes de drogas, com depressões – porque é como se precisassem ter tudo, um playground de motivações o tempo todo. Acham que precisam ter tudo e não é isso que é bom. Lembro que alguns anos atrás para criança ter alguma coisa era mesada, tinha limites. Nem ter todas as férias, nem todas as festas. A mãe que dá um pouco talvez esteja dando muito e é importante que esta mãe saiba que esta quantidade dela pode ser não tão grande, mas pode ser preciosa. RS: Muitas mulheres quando ficam grávidas enfrentam problemas no trabalho. Tem que haver uma divisão? DK: É difícil e importante porque, em algumas profissões, não dá mesmo para conciliar (como jogadoras, modelos…). Hoje em dia, está se adiando a maternidade por conta da medicina, da carreira, da longevidade, da cultura. Precisamos ter dinheiro, ajudar o marido, ter independência e postergar coisas, como a gravidez. RS: Mulher, carreira, filho. Sobra tempo para o marido? DK: É importante. Este marido vem aqui e diz que quer ser cuidado, que não aguenta mais ver as calcinhas penduradas na torneira… Ele quer afeto, quer o lado sexual. Então, muitos casamentos entram num vácuo. Mulheres cansadas adiam o encontro sexual. Então, é muito importante o papel de mulher. Manter o encontro homem/mulher é fundamental. Filhos gostam de perceber que entre pai e mãe existe algo que eles não precisam fazer parte. Freud chamava de “o terceiro excluído”. A criança não tem que participar de tudo, não tem que estar em todas as camas. Aí entram os limites. A mãe precisa se cuidar e ter espaço para namorar. Se é casada ou não, precisa ser olhada. Mas muitas mães fazem dos filhos maridos, e acabam adoecendo os filhos e se adoecendo também. RS: Tem mulheres que quando os filhos nascem optam por parar de trabalhar. É uma boa opção? DK: É uma opção. Só que eu vejo que, lá na frente, paga-se um preço. Essa opção dá uma zona de tranqüilidade legal por alguns anos. Mas na minha experiência como profissional há 30 anos, eu tenho visto que, quando começa a bater a história do “ninho vazio” (filhos namorando, filhos que saem de casa), ela precisa se dedicar a alguma coisa. Todo mundo tem que ter algo para fazer, seja trabalho ou trabalho social voluntário. RS: Como conciliar? Existe meio termo? DK: Acho que as pessoas que conseguem não ser tão exigentes e vão fazendo aos poucos… Em alguns momentos, dão umas paradas… Elas podem se permitir até momentos sabáticos. Numa hora, cuidar mais disso, em outra menos… Sem abandonar sonhos. Tem um brilho no olhar diferente quem consegue se reconstruir. RS: Como se sente uma mulher em ascensão na carreira quando engravida? DK: Para algumas é o coroamento porque sentem “agora eu tô podendo, vou ter um filho”. Para algumas bate desespero, medo… Tem que trabalhar quem é este filho, que espaço ele vai ter. RS: E a volta ao trabalho após licença-maternidade? DK: É difícil, mas importante, porque a mulher precisa voltar. O ambiente de trabalho também deve reconhecer que ela está voltando. Mas talvez num outro ritmo. Não é mais só ela. Ela tem preocupações novas agora. Passa a ter uma sensibilidade maior – que até pode ajudar muito. Nos EUA e na Europa, estão voltando a pensar no meio período de trabalho e tem dado certo. A mulher fica mais em casa e rende mais no trabalho. RS: Crianças precisam de pais por perto? DK: Pais sempre são importantes. Precisam estar próximos. A criança precisa de formação. O olhar da mãe cuida e alimenta, ajuda num caminho. Ela pode fazer isso trabalhando. Sem dúvida, o filho vai se orgulhar dela e vai ser bom para ela. Ela vai se olhar no espelho e dizer “que legal, foi cansativo, mas eu estou aqui! “. — Por falar em conflito entre carreira e maternidade, clique aqui e confira a entrevista que Mariana Kotscho deu para o site Vila Mulher falando sobre o assunto.  E para quem perdeu o programa de hoje, fique ligado nas reprises: domingo (13h30), segunda (12h30) e terça (17h30). Valeu, gente!