Papo de Mãe

Um apelo de uma mãe do coração desesperada

Tenho a guarda provisória para fins de adoção do meu filho desde 25/04/12 (ele tinha 9 meses) e até hoje, 15/05/18, ele tem 6 anos e 10 meses, aguardo a DPF. Essa demora tem feito com que passemos por situações constrangedoras, desgastantes e humilhantes no nosso dia-a-dia.

Roberta Manreza Publicado em 25/05/2018, às 00h00 - Atualizado às 18h12

Imagem Um apelo de uma mãe do coração desesperada
25 de maio de 2018


Por Adriana, mãe do F.
25 de Maio – Dia Nacional da Adoção

O meu maior desejo no momento é que sejam respeitados e preservados os Direitos Humanos do meu filho a pertencer “de direito” à nossa família.

Encontrei o meu filho, nascido C., em Paracambi – RJ, através do cadastro Nacional de Adoção. Todo o processo legalmente. Estou habilitada desde 2009 e foram 3 anos , 5 meses e 12 dias de fila até nos encontrarmos. Há mais de 6 anos sou apenas sua guardiã, não podendo concluir o processo de Adoção devido a destituição do Poder Familiar ainda não ter sido “transitada em julgado”. Tenho a guarda provisória para fins de adoção do meu filho desde 25/04/12 (ele tinha 9 meses) e até hoje, 15/05/18, ele tem 6 anos e 10 meses, aguardo a DPF. Essa demora tem feito com que passemos por situações constrangedoras, desgastantes e humilhantes no nosso dia-a-dia. Como, por exemplo:

– Até o momento não foi possível batizar o meu filho com o nome de F., pois o Padre, só pode batizá-lo pelo nome escrito na certidão de nascimento, C..

– Todas as vezes que precisamos de Atendimento Médico, e foram muitas as vezes até agora, inclusive internação hospitalar e cirurgias, preciso explicar para todos os profissionais envolvidos, desde o agendamento via telefone, recepcionistas, até enfermeiros, plantonistas, médicos, fisioterapeutas e etc. que o nome que ele se reconhece não é o da Carteirinha do Plano de Saúde, tendo que expor a nossa intimidade, a nossa família, o meu filho, o tempo todo para estranhos.

Saiba que somos muito bem resolvidos em relação à adoção. Ele sabe toda a sua história, sabe da forma como a nossa família foi formada. Tenho muito orgulho da nossa história mas ela é nossa, do meu filho, e deveríamos ter a opção de conta-la ou não para quem assim desejarmos e não sermos obrigados a  essa exposição desnecessária toda vez que precisamos utilizar um documento. Até agora meu filho não tem certidão de nascimento, RG, CPF, passaporte ou qualquer outro documento onde conste seu nome F. e o meu, sua mãe. Temos e seguimos apenas com a Guarda Para Fins de Adoção.

– 2017 foi o último ano dele na creche onde estudou desde 2014. No início fui falar com a Diretora, expliquei toda a situação, mesmo porque ainda estávamos dentro de um prazo razoável (1 ano e 7 meses) para guarda provisória e, por sorte, fui muito bem acolhida. Todos os documentos que vinham para casa e em sala de aula estavam no nome que demos, F. Apenas os documentos oficiais para controle interno estavam no nome C..

Esse ano ele iniciou o 1º ano e foi necessária a mudança de escola, todos muito felizes com tudo novo mas os problemas “velhos”. Novamente fui obrigada a explicar toda a burocracia em relação aos nomes para secretaria, coordenação, direção, professoras, porteiro e etc. Em resposta às minhas preces fomos muito bem acolhidos e a nova escola também usa seu nome social.

Agora ele já percebe quando existe a confusão de nomes o que gera constrangimento e responde: Eu não sou o C., eu sou o F.! O que piora muito a situação porque todos me olham como se eu estivesse mentindo e sequestrando o MEU FILHO.

 Resumindo, em todas as situações onde preciso apresentar um documento dele é sempre tenso, desgastante, humilhante, invasivo e constrangedor.

– Viagens (avião, ônibus e etc.)

– Consultórios médicos, hospitais, terapias, Igreja, plano de saúde, escola, cursos extra curriculares…

 Sou Comissária de Bordo e ainda não pude levar meu filho para viajar para o exterior comigo. Mais um exemplo de como meu filho está sendo privado de pertencer, de fato e de direito, à nossa família.

 Após exposta a nossa situação, como mãe, imploro que a os direitos do meu filho sejam respeitados e preservados através da verificação do excesso de prazo no processo da DPF de C., para que ele possa se tornar, oficialmente, F., o mais rapidamente possível, tendo sua nova certidão de nascimento e eu possa assumir  o meu papel de sua mãe “de direito”. Cada vez que penso nesse fato tenho vontade de sair correndo pelada no meio da rua com a frase : DESTITUAM O MEU FILHO, POR FAVOR escrita no meu corpo para chamar a atenção para nós, famílias adotivas incompletas. No processo de adoção há 2 situações muito esperadas: a 1a é quando o seu telefone toca e a Vara da Infância e Juventude diz que existe uma criança no seu perfil para você conhecer. Esse momento é indescritível. A 2a e MAIS esperada ainda é quando você recebe a informação que a NOVA CERTIDÃO de nascimento de seu filho já pode ser emitida. Criei um grupo de famílias no whatsapp que estão na mesma situação onde reuni em apenas 3 dias mais de 40 famílias que aguardam ansiosamente com seus filhos a conclusão do processo de adolção há mais de 3 anos. Há uma famíla aguardando há 8 anos e uma outra que conseguiu no final do ano passado a tão sonhada nova certidão após 10 ANOS de processo. Somos famílias de todo o Brasil.

Aqui abaixo copiei a resposta que obtive do CEDCA (Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente)

Em se tratando de processo judicial em tramitação qualquer demora e prejuízo para a criança deve ser objeto de reclamação junto ao Tribunal de Justiça do Estado ou até mesmo CNJ. Não há o que o CEDCA possa fazer além de encaminhar o presente email para a Coordenadoria de Articulação das Varas de Infância, da Juventude e do Idoso da Capital para conhecimento. Infelizmente a demora do andamento processual é algo recorrente nas Varas de Infância e Juventude, assim como nos tribunais superiores, que desconsideram a prioridade absoluta na tramitação desses processos, inexistindo órgão especializado em infância tanto nos tribunais de Justiça como nos tribunais superiores. Com essas considerações pode ser informado à adotante nossa impossibilidade de atuação no caso concreto, em se tratando de órgão deliberativo e fiscalizador das políticas públicas destinadas à infância e juventude.

Eufrásia Maria Souza das Virgens

              Conselheira do CEDCA

Fizemos um resumo, Cristina (mamãe da V.) e Eu (Mamãe do F.), bem simplificado, do caminho para a adoção de uma criança e/ou adolescente no Brasil.

– A primeira fase do processo de adoção é chamada de “processo de habilitação”, não há necessidade de acompanhamento por advogado, apesar de algumas pessoas preferirem contratar um advogado para acompanhar na tramitação desta fase, que dura em média 06 meses a 01 ano. Há estados que a demora é maior, por não haver vara especializada (Infância e juventude), então os processos são avaliados por um juiz comum, que acumula várias causas de assuntos diferentes.

– Depois de habilitado, o pretendente à adoção entra em uma “fila” de espera aguardando ser chamado pela da vara da infância, quando existir uma criança com o perfil compatível ao perfil indicado pelo habilitado. Primeiramente em sua própria comarca (onde foi habilitado) e caso não haja criança no seu perfil entra na fila do CNA (Cadastro Nacional de Adoção), se o adotante se cadastrou para outras cidades e/ou estados.

– A partir desta fase, é obrigatório o acompanhamento por um advogado, por ser uma fase judicial. A família que tem não tem condição financeira poderá ter seu processo acompanhado pela Defensoria Pública (são advogados concursados em cada Estado, para atuar gratuitamente quando as pessoas não têm condição de pagar um advogado privado). Geralmente essa condição é avaliada apresentando declarações de imposto de renda, três últimos contracheques, três extratos bancários dos últimos três meses. A renda familiar não pode ultrapassar 03 salários mínimos. Do contrário, se a família possui suficiência financeira, deve contratar um advogado particular.

– Após a alteração sofrida pelo Novo Código de Processo Civil em 2017, o papel que era do Ministério Público (MP), de atuar como representante da família biológica (quando esta não é encontrada) nos processos de Destituição do Poder Familiar (DPF),  passou a ser da Defensoria Pública.

Vale ressaltar que os membros do MP não são advogados, o MP atua em defesa, independente, da sociedade e da democracia. A instituição tem o papel de fiscalizar e proteger os princípios e interesse fundamentais da sociedade, em especial dos vulneráveis, que é o caso das crianças. É independente dos Três poderes – Legislativo,  Executivo e Judiciário. Como não são advogados não podem atuar na defesa de famílias de forma a assisti-las judicialmente, pois este é um papel do advogado, seja ele público ou privado. O MP dará suporte na defesa dos interesses do menor.

A priori, quando há adoções tardias (crianças acima de 08 anos), há necessidade do estágio de convivência, que geralmente não ocorre quando a criança é bebê. Neste estágio há o monitoramento pela Justiça e pela equipe técnica, é permitido ao pretendente visitar o menor no abrigo onde ele mora e dar pequenos passeios a fim de que se aproximem e se conheçam melhor. Estágio de convivência também chamado de fase de aproximação.

– Se o relacionamento correr bem, a criança é liberada e o pretendente entrará com a ação de adoção. Ao entrar com o processo, o pretendente receberá a guarda provisória, que terá validade até a conclusão do processo. Nesse momento, a criança passa a morar com a família. A equipe técnica continua fazendo visitas periódicas e apresentará uma avaliação conclusiva.

Durante a guarda provisória, no processo de adoção, que muitas vezes é dada de 120 em 120 dias, ou pode ser requerida, pelo advogado, sem prazo determinado até o processo ser finalizado, ocorre paralelamente processo de Destituição do Poder Familiar. E neste processo há várias tentativas para encontrar os pais biológicos ou a família extensa (tios, avós, irmãos mais velhos, etc.) E é nesta fase que o processo costuma se estender e demorar muito, pois as tentativas são cansativamente excessivas na busca de chamar ao processo estes interessados, e no caso  de não se encontrar, há a possibilidade de chamamento, por edital, contudo,  a defensoria os representa,  contestando as ações, recorrendo e agindo em seu nome (obrigatoriamente).

– Quando finalmente ocorre a Destituição do Poder Familiar, o juiz profere a sentença de adoção e determina a lavratura do novo registro de nascimento, já com o nome e sobrenome escolhidos pela nova família. Existe a possibilidade de manter ou de trocar o primeiro nome da criança. Nesse momento, a criança passa a ter todos os direitos de um filho biológico.

– Existe uma nova legislação aprovada ano passado que limita o prazo para a conclusão dos processos de adoção, Lei 13.509 de 22/10/2017 parágrafo 10, que estipula o prazo máximo para a conclusão da ação de adoção a 120 dias, “prorrogável uma única vez por igual período, mediante decisão fundamentada da autoridade judiciária”, ou seja, no máximo 240 dias para conclusão do processo de adoção.  ESSA É A NOSSA LUTA: O CUMPRIMENTO da nova Lei.

Neste 25 de maio (dia Nacional da Adoção),gostaria de perguntar “E depois da guarda?”.  O nosso foco é mostrar que, após o encontro de nossos filhos, quando nos é dada a guarda para fins de adoção (longo caminho pra chegar até aqui) ainda há, nos casos em que a criança não está Destituída do Poder familiar, um LONGO, DESGASTANTE, HUMILHANTE e ESTRESSANTE caminho até a conclusão do processo de adoção que é finalizado com a nova certidão de nascimento da criança que passa a pertencer, de direito, à família.

Estou nessa luta há mais de 6 anos, ou seja, ainda não consegui  ter a nova certidão de nascimento do meu filho, F., que está em fase de alfabetização, momento crucial de reconhecimento de sua identidade através da escrita de seu nome, ainda social, pois o que está na certidão de nascimento é totalmente diferente de como ele se reconhece.

Pertenço ao mundo adotivo há, mais ou menos, 10 anos. Minha habilitação saiu em 2010, após 01 ano da entrada da papelada e início de todo o processo. Durante esse tempo, em matérias sobre Adoção, somente são abordados assuntos referentes ao início do processo, ou seja, como é demorado o tempo para conseguir a habilitação; como é demorada e burocrática a espera pelo filho; como a conta entre crianças disponíveis  X adotantes não fecha; como a fila não anda devido ao perfil restrito dos adotantes e etc., ou seja, temas relacionados ao período anterior à chegada de nossos filhos. Nada é dito sobre o pós-adotivo, quer dizer, depois que nossos filhos chegam ainda falta muito, o que é um descaso e desrespeito à Lei 13.509 de 22/10/2017 “que estipula o prazo máximo para a conclusão da ação de adoção a 120 dias, prorrogável uma única vez por igual período, mediante decisão fundamentada da autoridade judiciária.”

Nossas famílias precisam ser reconhecidas, nossos filhos respeitados…  A tortura psicológica que nossos filhos sofrem durante essa espera pela mudança do nome é desumana, sofrida e totalmente desnecessária. Muitas vezes se sentem inseguros quanto ao pertencimento à nova família, tendo muito medo de retornar para o abrigo ou até mesmo à família de origem. Precisamos preservar a integridade física, moral, mental e psicológica de nossos filhos. No meu caso esse dano não foi tão profundo devido meu filho ter vindo bebê, mas existem incontáveis casos de adoção tardia (crianças maiores e adolescentes) que têm marcas profundas de maus tratos, abuso, danos físicos que estão sendo trabalhados em suas novas famílias com muito amor, carinho e apoio profissional, mas nossos filhos não entendem o porquê, por exemplo, de não poderem ser chamados pelos seus novos nomes, ou escrever seu novo sobrenome em uma prova da escola.  Nós que somos os adultos não entendemos, imagine as crianças? Conforme expliquei no nosso 1º contato, como é difícil passar por todas aquelas situações (médico, hospital, viagens, escola e etc.) somente porque meu filho ainda não está em meu nome.

Uma observação:

Com o advento da Lei nº 7930 de 02 de abril de 2018, de autoria do Deputado Estadual Flavio Serafini, as crianças que estão sob guarda provisória enquanto o processo de adoção ainda não foi concluído, adquiriram o direito de fazer uso do nome “social/afetivo” (o nome novo) em instituições de saúde,  escolas, em todos os locais, sejam públicos ou privados , onde seja necessária a apresentação de um documento da criança. MAS, por enquanto, essa LEI é válida apenas para o Estado do Rio de Janeiro.

Sendo assim eu, Adriana Mariani, Mãe do F., peço encarecidamente, a ajuda de vocês em meu nome e em nome de TODAS as outras na mesma situação espalhadas nos quatro cantos desse nosso Brasilzão.

Muito obrigada! Não tenho palavras para agradecer.

Adriana Mariani, mãe do F. (chegou com 9 meses e hoje tem 6 anos e 10 meses)

Tenho a guarda desde 25/04/2012



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