Papo de Mãe
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O que o seu filho vai ser quando crescer?

Será magnífico quando cada criança tiver os cuidados, o afeto e incentivo de todos os setores da sociedade, para que ela se torne aquilo que deseja, independentemente de suas características

Thaissa Alvarenga* Publicado em 23/06/2021, às 08h00

As crianças vão ser o que elas quiserem?
As crianças vão ser o que elas quiserem?

É bem provável que, quando você segurava seu filho em seus braços, ainda bebê, tenha imaginado: o que este pequenino será quando crescer?

Com todos os receios que a maternidade e da paternidade provocam, a independência e a escolha de carreira são assuntos discutidos e trabalhados ao longo da vida jovem de um filho, para que ele esteja pronto quando o momento chegar.

Para pais de filhos com deficiência, os anseios e medos que percorrem a trajetória de crescimento educacional e profissional são maiores. A luta para vencer barreiras que impedem a construção de uma cultura organizacional que possibilitam uma inclusão efetiva em escolas e empresas começa bem cedo.

Uma em cada sete pessoas no mundo possui alguma deficiência. No Brasil isso representa 24% da população (IBGE, 2010). Tente lembrar: na rotina de ir ao supermercado, bancos e shoppings, quantos PCDs você já encontrou? Ou na escola dos seus filhos, quantos coleguinhas são autistas, por exemplo? Você já se sentou com sua família e assistiu a um jornal na TV com um âncora em uma cadeira de rodas?

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A lei de cotas já amadureceu no papel com 30 anos de criação, porém, estamos longe de alcançar na prática seu cumprimento de forma plena. Uma empresa com 100 funcionários ou mais é obrigada por lei a ter de 2% a 5% dos seus cargos preenchidos por pessoas com deficiência em nosso país. É o que prevê o artigo 93 da Lei nº 8.213/91.

Esta lacuna apresenta a dificuldade da falta de inclusão, que nada mais é do que um processo bilateral, no qual as partes buscam, em parceria, tornar a sociedade um ambiente com acessos e direitos equivalentes.

Temos visto maior representatividade tanto na área das artes cênicas quanto na política. O público está acostumado com o Cripface, que é quando um ator ou uma atriz sem deficiência interpreta um personagem que tem. E não precisa ser assim.

A influencer e atriz Sassá Quadrado, por exemplo, estará na próxima novela das 21 horas da TV Globo - Um Lugar ao Sol. Uma pessoa com deficiência interpretando um personagem que também a tem possibilita que as vivências e narrativas sejam mostradas de forma mais verdadeira.

Outra estreia foi a da atriz Kiera Allen, de 24 anos, com o filme “Fuja”, sucesso na NetFlix em junho, onde se tornou a primeira cadeirante protagonista de um filme de terror em mais de 5 décadas. Em 2017 nós tivemos outra ação inclusiva positiva também com uma jovem atriz, Millicent Simmonds no filme “Um Lugar Silencioso” que trouxe a representatividade dos surdos no cinema.

No campo político, Jorginho Mota é um grande exemplo. Em sua primeira disputa eleitoral, ganhou 2.073 votos, se tornando assim, o primeiro vereador autista no país em 2021.

Esta diversidade inclusiva é a prova de que há esperança para e espaço, para que todos tenham a chance de mostrarem seu potencial.

É claro que, quando os amigos do Chico, meu primeiro filho, começarem a se preparar para o vestibular, haverá um planejamento diferente que eu, mãe de uma criança com síndrome de Down, irei seguir, pois as portas para uma vida adulta, independente e com uma profissão, são as que sempre devemos lutar para manter abertas.

A colunista Thaissa Alvarenha e os filhos Chico, Maria Clara e Maria Antônia
A colunista Thaissa Alvarenha e os filhos Chico, Maria Clara e Maria Antônia

É difícil prever como será a trajetória de uma criança com deficiência, assim como de uma criança sem nenhuma comorbidade, em sua vida adulta ou em um emprego. Foi com a mesma imprevisibilidade que meu coração acelerou ao levar meu filho para o seu primeiro dia na escola, e sei que será assim em seu primeiro dia no trabalho.

O fato é que pessoas com deficiência estão mais presentes em nossa vida do que imaginamos e sempre trato deste assunto da maneira mais simples e direta no meu dia a dia. Eu sou mãe de três e costumo dizer para as minhas filhas mais novas, Maria Clara e Maria Antônia: “O irmão de vocês tem síndrome de Down”; e elas entendem e explicam esta informação de maneira natural.

O mundo é um banquete de diversidades no universo da música, da arte, da atuação, da tecnologia e da ciência. Com a quantidade de informações que consumimos, nem sempre conseguimos identificar que aquele ator favorito ou muitos dos personagens que gostamos trazem uma característica atípica, muitas vezes despercebida aos nossos olhos. Cabe a nós trazer ao seio da família a pluralidade e representatividade, incluindo o tema deficiência parte da conversa na mesa na hora do jantar.

Faço aqui um convite de mãe para mãe: o que podemos melhorar agora em nossa sociedade, para que nossos filhos possam ser o que eles quiserem quando crescerem?

Que magnífico será o dia em que cada criança tiver os cuidados, o afeto, e incentivo de todos os setores da sociedade para se tornar aquilo que deseja, independentemente de suas características.

*Thaissa Alvarenga é criadora da ONG Nosso Olhar e o portal de conteúdo Chico e suas Marias

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