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Se as leis que existem fossem aplicadas, casos como o do menino Henry poderiam ser evitados, diz especialista

O advogado Ariel de Castro Alves, membro do Instituto Nacional dos Direitos da criança e do adolescente, analisa o caso do menino Henry, relembra outros casos a reforça a importância de cumprimento leis como a chamada “Lei da Palmada”. 32 crianças e adolescentes são assassinadas por dia no Brasil

Mariana Kotscho* Publicado em 09/04/2021, às 00h00 - Atualizado às 22h00

“É preciso ouvir as crianças e denunciar quando houver suspeita de agressão” - Reprodução
“É preciso ouvir as crianças e denunciar quando houver suspeita de agressão” - Reprodução

Será que se as leis que existem no Brasil para proteger crianças e adolescentes fossem aplicadas, a morte do menino Henry, de 4 anos, no Rio de Janeiro, teria sido evitada? O padrasto e a mãe dele estão presos e vão responder pelo crime.

Em entrevista ao Papo de Mãe, o advogado Ariel de Castro Alves disse que o Brasil precisa trabalhar na prevenção de casos como este. São Henrys, Bernardos, Isabelas, Sofias…32 crianças e adolescentes são assassinados no Brasil por dia, de acordo com o Unicef.

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Ariel é advogado especialista em direitos da infância e da juventude e membro do Instituto Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, além de ex-conselheiro do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente). Como conhecedor do tema, ele faz um apelo para toda a sociedade:

“É preciso ouvir as crianças e denunciar quando houver suspeita de agressão”.

O advogado Ariel de Castro Alves
O advogado Ariel de Castro Alves

A violência doméstica no Brasil tem números considerados de uma epidemia e ela atinge não só mulheres, mas também crianças. “Nós temos um contexto de violência do país, um histórico de violência doméstica. É necessário analisarmos como prevenir e punir responsáveis, porque a sensação de impunidade gera mais crimes. Sempre que temos uma situação assim, nós notamos indícios de situações anteriores, de que a criança já vinha sofrendo uma violência, não é de uma hora pra outra. E na pandemia aumentou”, alerta o advogado.

Além do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), o Brasil conta com duas leis recentes que protegem, ou deveriam proteger, as crianças. Uma delas é a Lei Bernardo, de 2014, popularmente chamada de Lei da Palmada, e outra é a Lei da Escuta Protegida e do depoimento Especial, de 2017.

Lei Bernardo, ou Lei da Palmada

Esta lei proíbe que pais e mães se utilizem da agressão para educar seus filhos. Nem palmada, nem nada. Não se pode usar castigo físico em crianças. “Quando houver denúncia, as pessoas devem ser encaminhadas para programas de apoio e orientação. O problema é que esses programas não foram criados e nem existem na maioria dos municípios. Esses pais precisam ser educados para aprender a cuidar dos seus filhos”, explica Ariel de Castro Alves, que completa: “Ela não é uma lei punitiva, é preventiva, mas acaba não sendo cumprida”.

O menino Bernardo, que dá nome à lei, foi assassinado em 2014,  aos 10 anos, pelo pai e pela madrasta, e investigações revelaram que ele já vinha sofrendo agressões sucessivas por muito tempo.

Dr. Ariel lembra que é dever da família, do Estado e de toda a sociedade proteger crianças e adolescentes: “Quem sabe de algo e não denuncia pode até responder por crime de omissão de socorro”. Ariel participou de debates na época em que a lei estava sendo discutida, junto com o movimento “Não bata, eduque”.

Uma balança, símbolo da justiça
Existem leis no Brasil que poderiam proteger as crianças, mas estão só no papel

Lei da Escuta Protegida

Esta lei estabelece o sistema de garantia de direitos às crianças e adolescentes vítimas e testemunhas de violência, que é a chamada “lei do depoimento sem dano”, que trata da escuta protegida da criança e do depoimento especial.

Quando chega uma denúncia na polícia, no conselho tutelar, na promotoria ou na vara da infância, a escuta tem que ser imediata e por pessoas qualificadas, as crianças precisam ser ouvidas e com segurança.

Ariel de Castro ressalta que o que faltou no caso Henry também foi uma escuta dele, de os adultos no entorno perceberem e entenderem o que estava acontecendo. Deixar de ouvir o menino e de denunciar o que já vinha acontecendo há algum tempo: “Infelizmente algumas crianças e adolescentes dormem com seus inimigos”.

Assista aqui à entrevista completa com o advogado Ariel de Castro Alves e inscreva-se no Canal Papo de Mãe

“O Brasil tem uma das melhores legislações de proteção de crianças e adolescentes, mas é preciso que essas leis saiam do papel, nós temos uma diferença entre a lei e a prática e ainda tem a  falta de uma prioridade na área social.” (Ariel de Castro Alves)

Disque 100

O disque 100 é o número que existe para fazer denúncias, e elas podem ser anônimas. Em 2019, foram recebidas 87 mil denúncias de violações de direitos das crianças pelo disque 100. O número saltou para 95 mil em 2020 com a pandemia. E uma constatação: antes da pandemia, pelo menos 60% das agressões aconteciam em ambiente doméstico. Este número ficou ainda maior em 2020 na pandemia: entre 80% e 90%, com as crianças em isolamento dentro de casa.

“Com as escolas fechadas (o que é necessário neste momento), a situação se agrava porque na escola educadores podem identificar se a criança sofre agressões em casa. A criança pode ter marcas ou muda seu comportamento. Outros familares precisam ficar atentos: avós, tios, pai ou mãe que não moram com a criança”, diz Ariel de Castro Alves.

E conhecidos, como vizinhos, também devem denunciar. Toda a sociedade precisa estar atenta à segurança de crianças.

Entenda o caso Henry

O menino Henry, de 4 anos, foi morto no dia 8 de março no apartamento na Barra Tijuca (RJ), onde morava com a mãe e o padrasto. O casal, no início, alegou um acidente com a criança, que teria caído da cama.

No dia 8 de abril, o  vereador Dr. Jairinho, padrasto, e a professora Monique Medeiros, mãe de Henry, suspeitos pelo assassinato do menino Henry Borel, foram presos. Eles estão sendo investigados por homicídio duplamente qualificado, com emprego de tortura e recursos que impossibilitaram a defesa da vítima.

A perícia feita no corpo de Henry apontou que a causa de sua morte foi uma hemorragia interna e uma laceração no fígado causada por uma ação contundente.

Leia a reportagem completa no UOL

@arieldecastroalves/ twitter: Decastroalves

*Mariana Kotscho é jornalista e apresentadora do Papo de Mãe

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