Papo de Mãe
CANCÊR RARO

Retinoblastoma: tratamento e aconselhamento genético do câncer ocular infantil

Saiba quais são os sinais mais indicativos da presença de um retinoblastoma

Paulo Taufi Maluf Jr* Publicado em 02/02/2022, às 10h36

Leucocoria: brilho esbranquiçado ao reflexo luminoso, que lembra “olho de gato”
Leucocoria: brilho esbranquiçado ao reflexo luminoso, que lembra “olho de gato”

Eis que vem à tona o nome de uma condição da qual muito pouca gente já tinha ouvido falar. De fato, e aqui vai um alento, a doença é rara, calcula-se que ocorra em uma a cada 20.000 crianças nascidas vivas, e aí vai outra característica, sua incidência quase que exclusiva na população infantil, mais caracteristicamente na faixa dos 2 primeiros anos de vida. Trata-se de um tumor maligno, a cujos portadores se faz necessário acolhimento em serviços de oncologia pediátrica, dado o envolvimento requerido de equipes multidisciplinares para atenção a esses pacientes.

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O retinoblastoma se inicia com a formação e multiplicação rápida de células anômalas na região da retina (Fig 1), que vem a ser uma camada que recobre a parte posterior do globo ocular. Na maior parte das vezes a enfermidade é unilateral, mas em cerca de 25% há acometimento bilateral, dos dois olhos.

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Estrutura do globo ocular com detalhe de retina

O retinoblastoma é, dentre os tumores, um para os quais se têm estudos mais aprofundados no que tange a sua origem. Sabe-se que ele advem de mutações de um gene bem conhecido, o gene RB1. Essas mutações ocorrem de forma aleatória na maior parte das lesões unilaterais mas, no caso dos processos bilaterais, pelo menos uma delas se origina ainda na fase gestacional, e podem ou não serem transmitidas por um dos genitores, ou seja,  tem-se uma modalidade de câncer na forma hereditária.

Dos sinais mais indicativos da presença de um retinoblastoma, o mais significante é o de leucocoria (Fig 2), que vem a ser um brilho esbranquiçado ao reflexo luminoso, que lembra “olho de gato”. Dentre os recursos de avaliação de recém-nascidos inclui-se, rotineiramente, um exame ocular de luminosidade, considerado normal quando reflete cor avermelhada;, reflexos com cor branca são suspeitos de anomalias, inclusive tumores intraoculares. É também comum que a leucocoria se mostre evidente após fotos com flash, que costumam resultar em olhos vermelhos nas imagens mas, excepcionalmente, se há uma criança com o brilho esbranquiçado, o alarme é suscitado. Estrabismo, movimentos oculares desordenados, processos inflamatórios que não se resolvem, volume aumentado de globo ocular, ou ainda olhar enviesado, todos devem demandar a visita imediata ao oftalmologista, pois são manifestações que podem induzir ao diagnóstico do câncer retiniano.

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Leucocoria

O tratamento, quando a doença é surpreendida na fase inicial restrita à retina, pode ser bastante simples e focal, por meios físicos como fotocoagulação, crioterapia, laserterapia, termoterapia, com excelente resultado sem prejuízo para a visão. Sucede que, infelizmente, casos muito localizados não dão sinais e, quando a leucocoria se manifesta, já se tem tumor avançado dentro do globo ocular. Nessas ocasiões impõe-se, em boa parte das vezes, a retirada do olho e nervo óptico complementada por tratamento adicional, que se dá com quimio ou radioterapia se o efeito infiltrativo da lesão assim o determinar. Para as doenças bilaterais há a preocupação em conservar pelo menos um dos olhos e, para tal propósito, o emprego de quimioterapia pode acarretar diminuição da neoplasia ao ponto de permitir as intervenções locais. O sucesso do tratamento, quando o retinoblastoma não se estende para áreas extraoculares, é muito alto, com obtenção de cura em mais de 90% das crianças tratadas.

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Se o pequeno paciente tem doença bilateral, e for constatada a transmissão hereditária por um dos pais, a chance de um irmão ser portador da moléstia é de quase 50%. Isso faz com que tanto os casais que têm filhos com retinoblastoma, como também as crianças que sobrevivem e atingem idade adulta, sejam encaminhados para aconselhamento genético, a fim de planejarem o futuro de suas proles.

Em suma, o agora tão comentado retinoblastoma é raro, e mesmo assim os sinais iniciais devem ser reconhecidos prontamente pelos pediatras ou demais cuidadores, para que o encaminhamento para centros especializados se dê em tempo hábil. Isso posto, deve-se ressaltar que no Brasil há serviços de excelência, que assistem esses pequenos doentes com esmero equiparável aos de qualquer país mais adiantado, basta que as crianças não sejam trazidas com crescimento tumoral que inviabilize resultados favoráveis. Não se podem negligenciar exames de triagem no período neonatal para os nascituros de maior risco, quando diante da eventual implicação da hereditariedade presente em seus familiares, e o papel preventivo dos geneticistas que é crucial.

*Paulo Taufi Maluf Jr

Pediatra – Especialidade em Oncologia Pediátrica

Prof Livre-Docente em Pediatria pela FMUSP

Pediatra do Centro de Oncologia do Hospital Sírio-Libanês em São Paulo

Médico Assistente do ITACI – HCFMUSP

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