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Inclusão não pode ser a própria exclusão

A declaração do ministro de educação de que alunos com deficiência "atrapalham" as outras crianças provocou reações. A maioria da população apoia a inclusão

Lígia Fleury* Publicado em 20/08/2021, às 11h18

Inclusão é bom para todos
Inclusão é bom para todos

 “Crianças com deficiência atrapalham o aprendizado de outros estudantes ”. Essas palavras doem não no ouvido, mas na alma. O Ministro da Educação argumentou que crianças com deficiência atrapalham a aprendizagem de estudantes porque professores não são capacitados para classes inclusivas. Até quando esta política brasileira de décadas para justificar o injustificável irá persistir?

O fato de muitos cursos de Pedagogia não formarem Professores com a qualificação mínima para serem profissionais de excelência, não pode, jamais, ser motivo de uma fala e ações excludentes. A qualificação insatisfatória de muitas graduações aponta para a urgência em corrigir este caminho de formação profissional e não para a questão de que alunos não aprendem uns com os outros.

Quem, assim como eu, convive com crianças e adolescentes de inclusão, tem a perfeita noção do ganho que se tem quando todos, juntos e misturados, compartilham espaços de aprendizagem e de socialização. No mínimo, estão aprendendo a conviver com as diferenças, reconhecer as competências e a olhar o mundo de maneira plural.

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O ministro deveria ter dito algo como: “ os cursos de Pedagogia foram reformulados e nossos profissionais são capacitados para cumprirem a Constituição Brasileira, oferecendo Educação de qualidade para todos”. Mas além de não oferecer formação de qualidade, usa o erro para justificar outro, ainda maior.

A falha na formação docente não pode ser empurrado para baixo do tapete, nem, muito menos , justificar o injustificável. O mundo rompeu as fronteiras desde que a internet abriu possibilidades para a comunicação não ser apenas local ou um recorte. A pluralidade cultural invadiu nosso cotidiano e a inclusão ganhou seu espaço de honra na sociedade. Pessoas com deficiência tornaram-se, finalmente, visíveis.

Quando crianças e adolescentes com e sem deficiência compartilham o mesmo espaço, novas e ricas possibilidades de aprimorarem suas competências e superarem as dificuldades, acontecem o tempo todo. É pela troca entre os pares que valores de convivência são aprendidos; um que saiba ler uma história e conta para o outro ensina a beleza e a magia da leitura; outro que saiba pensar para a resolução de problemas, ensina o caminho para o pensar, criar, para a autonomia ou proatividade; um que compreenda as emoções partilha acolhida, empatia. Todos ensinam. Todos aprendem.

Uma mão estendida entre os pares ensina muito mais do que palavras mal colocadas. O Ministro precisa se preocupar em reestruturar os cursos de Pedagogia, qualificando os profissionais da Educação e poderia aproveitar para aprender com quem entende do assunto. Desta maneira, evitaria situações que me fazem sentir vergonha dos políticos brasileiros.

Eu proporia ao Ministro observar um dia dentro de uma escola inclusiva em que os profissionais sejam capacitados para o trabalho. Garanto-lhe que vai aprender muito mais do que se permanecer no pedestal de um cargo e trancado em um gabinete assinando papeis. O mundo precisa de proatividade com responsabilidade.

Tomara leitores e ouvintes das palavras que machucam a alma possam refletir e reconstruir a péssima contribuição de um ministro para a formação de uma sociedade mais justa em um mundo mais plural.

Ligia
Lígia Fleury

*Lígia Fleury é psicopedagoga e integra a equipe da Escola de pais XD @planetaletra

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