O primeiro amor: como lidar?

O psicoterapeuta Léo Fraiman relata como é o primeiro amor adolescente e orienta a forma que pais, mães, filhos e filhas devem tratar desse tema

Maria Cunha* Publicado em 12/06/2021, às 11h57

O amor na adolescência é um sentimento que transborda -

Dia 12 de junho, é o dia dos namorados no Brasil. Para falar sobre o assunto, mais especificamente sobre o o primeiro e amor e o namoro na adolescência, o Papo de Mãe conversou com o psicoterapeuta e educador Léo Fraiman, que explicou desde o efeito que a criação dos filhos tem nos relacionamentos até como os pais devem lidar com essa nova fase.

Os impactos da criação e do mundo atual

De acordo com Léo Fraiman, hoje em dia, os pais se tornaram fãs dos filhos. Isso começa já na gravidez, com o ensaio da barriga. Quando a criança nasce, já não se espera nem o aniversário, é mesversário. Além disso, o educador conta que as crianças atuais não podem ser frustradas. “É uma coitadinha que tem que ter todos os privilégios e está, cada vez mais, exposta. Imagina como fica o cérebro de uma criança, de um adolescente, que cresce sendo fotografado, idealizado, idolatrado, bajulado, privilegiado, mimado, o tempo todo”.

Léo Fraiman conta que, em seu consultório, recebe cada vez mais adolescentes que querem fazer cirurgia plástica, já que o real não dá conta de se comparar com o ideal. “É tanto filtro, tanto photoshop, imagem pra postar no Instagram, pra estar tudo perfeitinho que, de repente, a criança começa a se odiar, a achar que ela nunca é boa o suficiente, porque, o nosso eu real, tem marquinha de sol, dente torto, furinho na bunda, ou seja, nós somos todos pessoas reais, mas, neste mundo idealizado da weblândia, todo mundo é muito perfeito”, explica o psicoterapeuta.

O educador ainda comenta que, antigamente, as ideias eram outras, os pais proibiam o namoro antes de uma data específica ou não deixavam as filhas saírem com determinada roupa. Hoje, surgiu um outro oposto. “A gente vê mães de meninas de 6 ou 7 anos, que estão pintando unha das filhas, comprando roupinha da moda, coloca lista de presentes em certas lojas, super chiquérrimas e caríssimas, tudo pra comparar qual a filha que vai estar mais bem vestida. Até desfile de moda em festinha tem e com maquiador."

Em razão disso, Léo Fraiman conta que a menina chega na adolescência muito sexualizada, muito erotizada e, de alguma forma, já cansada de ter que dar conta deste ideal.

“É um ideal de exibicionismo, de sexualização e de muito pouco afeto, de muito pouco conteúdo amoroso. Amor é uma coisa muito diferente do sexo, pode até acontecer junto, mas são experiências muito diferentes e neste afã de exibir o filho em um palco, sempre idealizado, perfeito e editado da vida, o adolescente começa a se odiar. Eu nunca vi tanto adolescente deprimido, ansioso, com baixa autoestima e fechado, eles estão num auto-ódio, porque, muitas vezes, a família de hoje oscila entre abandono e uma idealização, ou seja, eu só sirvo se eu tiver perfeito, então eu não sirvo como pessoa”, relata o educador Léo Fraiman.

Assim, o psicoterapeuta explica que se este é o modelo de amor em casa, isso pode ser replicado pro namoro. “Um menino, hoje, não liga mais para uma menina se ele está afim, ele não pode, está desautorizado a ser si mesmo. Como é que eu vou ter felicidade, como é que eu vou ter prazer, se eu não posso ser quem eu sou? Inclusive, uma das belezas do amor da adolescência, no começo, é essa pureza, essa delicadeza, esse encanto, essa simplicidade, esse amor que transborda e que, no fundo, a gente não deveria perder nunca, mas que, neste mundo perfeitinho de plástico, feito pros outros verem, infelizmente, vem se perdendo.

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Como os pais lidam com o primeiro amor dos filhos?

Segundo Léo Fraiman, não é possível colocar todos os pais no mesmo lugar. O psicoterapeuta explica que existem, basicamente, quatro tipos de pais: os pais autoritários, os pais negligentes, os pais permissivos e os pais participativos.

Os pais autoritários: são aqueles que querem definir idade, horário, roupa, como vai fazer, como não vai fazer. Léo Fraiman explica que pode funcionar, só que é um custo de, muitas vezes, o filho acabar associando que o afeto, aquele sentimento genuíno, aquele bem querer que é puro, desprovido de egoísmo, deve ser aprisionado. Isso pode acabar sendo ruim de duas maneiras: ou o filho se fecha, porque ele percebe que não pode ser ele mesmo, ou dá mais vontade ainda e aí ele vai achar um jeito de burlar.

Os pais negligentes: são aqueles que não estão nem aí para o filho, o que tem um efeito tão ruim quanto o autoritário,porque é aquele pai ou aquela mãe que não olha pro filho, que não se importa com a filha, que não quer saber de nada do que está acontecendo, que finge que não vê. Léo Fraiman explica que, por exemplo, de repente, a menina está tomando pílula do dia seguinte como método contraceptivo, já tomou diversas vezes, e a mãe não tem ideia, porque está em um outro planeta, o planeta do sujeito oculto na oração, o que também é muito ruim, porque é uma das piores dores para um filho adolescente sentir que os pais não se importam com ele.

Os pais permissivos: De acordo com Léo Fraiman, “são os pais amiguinhos, os pais brothers”. É o modelo do melhor amigo, o pode parecer muito divertido, mas o psicoterapeuta explica que o adolescente gosta quando alguém cuida, se interessa e diz não, porque faz parte de ser adolescente não ter uma área do cérebro totalmente formada, a área do freio moral, do pensamento consequente e do limite. Então, como amor e a atração já são sentimentos transbordantes, no adolescente que ainda não tem esse freio, o autocontrole, a inteligência emocional totalmente bem desenvolvida, é necessário queria pais imponham limites.

Apesar disso, o educador relata que muitos pais, hoje, estão desautorizados, por eles mesmos, a dizer um não. “Eu já atendi no consultório mãe que fala assim: ‘Eu não gosto disso, o meu filho fica fechado dentro do quarto, fumando maconha com a namorada, transando o dia inteiro, e eu não gosto disso, mas se não fizer em casa, vai fazer na rua’. não é bem assim. Hoje, existe esse afã dos pais agradarem os filhos e, muito prematuramente, pais e mães se desresponsabilizam dessa função de paie de mãe que é, mais do que oferecer uma boa alimentação e uma boa escola, dar um contexto de valores”.

Léo Fraiman lembra que a vontade dos pais deve predominar, ou seja, se pro pai é indigno que o filho traga alguém de fora para dormir, é a casa do responsável, a regra do jogo e acabou. A gente tem que saber que na igreja a gente se veste de um jeito, no jogo de futebol de outro, na escola de outro, e pro meu pai, aqui na casa dele, eu devo esse respeito, como amanhã com meu chefe eu vou poder certas coisas e não outras.

Os pais participativos: são aqueles que têm conseguido um equilíbrio maior entre afeto e firmeza. Eles sabem conversar e impor limites sem medos. O psicoterapeuta pontua que se o filho decidir transgredir ou combater, vai ter discussão, vai ter conflitos, porque famílias boas e felizes não são aquelas que não tem briga, já que pessoas que se amam discutem, falam palavras pesadas e depois voltam, conversam, pedem desculpas.

“É uma ilusão a gente achar que o casamento, a família, a amizade, a parceria ideal não tenha conflitos, o adolescente que tem um terço a menos de receptores da dopamina já fica mais irritado, ele tem a córtex frontal não tão bem formada, tem mais dificuldade com controle de impulso, tudo pra ele é muito intenso. O adulto já tem um cérebro, espera-se, um pouco mais maduro, vai ter um processo de choque de crenças”, reforça o educador. 

Léo Fraiman continua ao dizer que embora o adolescente esteja em sua casa, também é a casa dos pais. “Então os pais preferem que os filhos façam na rua? Eles preferem que nem faça, ‘mas se eu não fumo maconha aqui, vou fumar na rua’, então nós vamos conversar com um psicólogo, com um médico já que você está buscando uma substância externa pra conseguir ter a calma que você poderia ter ao tocar piano, estudar, fazer faxina na casa, meditar, rezar, te ofereço 50 outras maneiras, mas este atalho, aqui dentro de casa, não”. 

O que dizer aos jovens

Léo Fraiman enfatiza que é preciso resgatar alegria do amor, a leveza. “O amor é uma coisa bonita, uma coisa gostosa, uma coisa leve, que transforma a gente, é muito saudável. A gente só precisa entender uma regra muito especial: esqueça o pronome possessivo “meu” namorado, “minha” namorada, porque como a gente deseja muito aquele ser humano que está lá e não é a gente, acabamos caindo na ilusão de falar é meu namorado, então ele tem que fazer isso, tem que desse jeito, se vestir daquele jeito, me ligar tal hora, tem que fazer FaceTime".

Mas, o psicoteraputa explica que não. O outro é o outro e, se entendermos que o que nos apaixonou e encantou é que o outro é não somos nós, mantivermos uma perspectiva de alteridade, terão momentos em que esse outro vai encaixar perfeitamente e outros não, e tudo bem. O educador ainda lembra que sim, o amor comporta briga, conflito e discussão, a questão, apenas, é como brigar, evitando ironia, desprezo, menosprezo e agressão e, caso perca a cabeça, erga de volta e peça desculpas.

“Amor é essencialmente querer conhecer o outro, cuidar do outro, respeitar, ser responsável. É um projeto, não é um sentimento só, você pode ter um sentimento amoroso, mas se você não tiver um projeto de querer conhecer essa pessoa, saber o que é importante para ela, poder cuidar dela, não sufocar e se tornar responsável por um pouco da felicidade dela. Isso é lindo no amor, a gente perceber que a gente não é completo, mas, ao mesmo tempo, a gente não precisa depender do outro”, conclui Léo Fraiman.

O que dizer aos pais

Aos pais, o psicoterapeuta afirma que as palavras-chave são empatia e paciência. “Os filhos ficam realmente atormentados quando o namorado ou namorada não liga e a gente não pode menosprezar esses sentimentos tão puros, tão importantes e tão marcantes. Pro adolescente é a vida dele e tudo é muito importante”.

Ao mesmo tempo, Léo Fraiman ressalta que os pais devem conversar com os filhos. “Eu lembro que uma vez, minha mãe foi muito sábia quando terminei um namoro, eu chorava desesperadamente, porque eu falava que nunca mais eu teria uma namorada que nem ela, nunca mais iria achar outra mulher que nem ela, e minha mãe disse que não iria mesmo. Eu tomei um choque, mas ela falou que este amor, com esta garota, deste jeito, não ia mesmo, mas a vida vai mostrar tantos outros amores, outras alegrias, outros encantos talvez maiores e melhores, profundos, mais encantadores, tem coisas lindíssimas te esperando no futuro. Eu nunca esqueci, acho que faz 40 anos que eu ouvi isso”, conta o educador e psicoterapeuta.

Léo Fraiman também cita o seu livro, “A síndrome de imperador”, em que ele fala da importância do colo com mola, ou seja, acolher o filho, atender e escutar, mas com mola, mostrando que tem caminhos, que o filho irá conseguir, e tudo tem jeito. “Às vezes tudo que o filho precisa é que você, pai e mãe, diga: estou aqui do seu lado, eu acredito em você, conta comigo”.

Apesar disso, o psicoterapeuta lembra que é importante dar os limites e valores claros. “Se pra você tudo bem o seu filho dormir com namorada, se cabe na sua forma de ver o mundo, tudo bem, mas se pra você isso é ofensivo, não. Se pra você o namorado da filha, andar sem camisa e sentar pra almoçar em cima da perna e tudo bem, está certo. Senão você olha pra ele e fala: Olha, "João", aqui em casa gente almoça com camisa, então você penteia o cabelo, põe a camisa e vem almoçar com a gente. Simples assim”, explica o educador.

Léo Fraiman finaliza ao dizer que os adolescentes reagem muito bem quando os pais são acertivos, não é preciso gritar e nem se calar. “O melhor jeito de ensinar um adolescente a se tornar gente, adulto e cidadão, é ser gente adulto e cidadão”.

Lembrando que criança não namora. O namoro acontece a partir da adolescência.

Confira a entrevista completa de Léo Fraiman ao Papo de Mãe

*Maria Cunha é repórter do Papo de Mãe

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