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Mãe: ser ou não ser

A colunista Mariana Wechsler traz uma reflexão sobre decidir ser ou não ser mãe

Mariana Wechsler* Publicado em 08/04/2022, às 09h11

Em dúvida sobre a maternidade?
Em dúvida sobre a maternidade?

Em qualquer lugar e espaço desse mundo as mães serão colocadas como uma grande maestra e responsável por todas as coisas que aconteçam com a criança. Não sei se você já parou para pensar, mas tudo isso é uma mistura do capitalismo moderno, com o patriarcado e por estarmos tão envolvidas não conseguimos enxergar essas nuances.

Essa consciência de dar um passo para trás para entender esse cenário que está colocado, só é possível se ter com o tempo e com a maturidade. Não vem no livro, no curso ou se quer quando a mulher engravida.

O tempo é muito maravilhoso. Só ele é capaz de nos fazer entender sobre a nossa própria história, a história do mundo, das civilizações. E na maternidade não é diferente, apenas o tempo é capaz de nos fazer compreender.

A mãe é colocada num papel de que precisa ter todas as respostas, a tal da maternidade da performance que nos faz acreditar que o nosso saber vai livrar a criança de todo mau.

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A verdade, é que nosso filhos não vão se livrar das questões complexas que compõe o ser humano. Podemos atravessar o maternar com afeto, com mais diálogo, olho no olho e presença. Com menos sofrimento, com menos dor e abandono, mas nada irá nos garantir a maternidade perfeita, aquela que não vai ter erros.

Quando acreditamos que a construção do mundo que nosso filho vê, está sob nosso controle nos colocamos diante de uma única possibilidade que é acertar. O que não é exatamente real, mas que funciona para nos manter presos a culpa, estabelecendo uma relação com o parentar que é pesada demais.

A infância é sim um espaço de tempo que precisa ser preservada e vivida com muito afeto, mas as frustrações, dores, medos e inseguranças também vão nos compor.

Melhor do que acreditar que temos a capacidade de proteger nossa criança de todo mal é nos disponibilizar com o ouvir e com amor para cuidar das dores que precisam ser sentidas no caminhar.

Jesper Juul um terapeuta familiar dinamarquês e autor de vários livros sobre parentalidade, dizia sempre que um problema da criança é um problema da família, perceba é da família, e não exclusivamente da mãe. E ainda podemos ir além, assumindo que um problema da criança é um problema da sociedade como um todo.

O sonho da maternidade é algo que impera no inconsciente feminino e muitas crianças nascem sem que a mulher tenha tido tempo necessário para elaborar seus desejos e percepções sobre o papel de mãe. Nesse processo é natural que aconteça uma transferência para a criança, que passa a ser o centro de devoção dessa mãe que se perde de sua identidade. Muitos conflitos familiares surgem dessa não elaboração e dessa fusão entre mãe e filhos.

Mães não se anulam. Mães são anuladas. Pela sociedade. Pela sobrecarga. Pelo patriarcado“ (Lian Tai)

Quando o nosso modelo de sociedade individualista falha em oferecer rede de apoio e em reconhecer que cada criança diz respeito não só à mãe, mas ao mundo que construímos, ela anula uma mulher. Coloca essa mulher escondida no porão da comunidade.

Assim como quando nossa cultura e estrutura familiar permitem responsabilidades completamente assimétricas entre o pai e a mãe ou quando se reconhece que um bebê necessita de atenção integral e que é humanamente impossível atender às suas demandas sozinha e se dedicar, ao mesmo tempo, a qualquer projeto pessoal ou mesmo de lazer, anula-se uma mulher.

O mito da mulher que se anula, quanto da mulher “guerreira“ que dá conta, reforça um ideal tão inatingível quanto opressor.

Esse modelo inalcançável nos torna eternamente erradas e em dívida.

E aqui estão algumas crenças que alimentam essa engrenagem que nos anula e nos oprime:

- É preciso dar conta de cuidar da criança e proporcionar educação emocional perfeitamente.

- É preciso dar conta de cuidar da administração da casa.

- É preciso ser uma profissional produtiva.

- É preciso ser atenciosa.

- É preciso ser atraente para o marido (é preciso ter um marido, claro).

- É preciso estar bem arrumada.

- É preciso continuar fazendo os mesmos programas de antes.

- É preciso atender a todas as expectativas sociais.

Temos que conseguir nos livrar do sentimento de culpa e do medo do julgamento dos que defendem essa ou aquela forma de criar os filhos. Precisamos é discutir com seriedade a criação das crianças, os direitos que possuem à saúde, educação, cultura, esporte, a construção de uma cultura de não violência que saia do nível do individualismo e seja mais abrangente, que trate de temas sociais como racismo, sexismo, homofobia, desigualdade social.

Essa é uma pauta coletiva e nesse entendimento mora a beleza do ser mulher e da maternidade. Tomara que ai more também uma mulher em busca do seu reconhecimento, devidamente acolhida por si mesma.

A necessidade de agradar, de cuidar do que o outro pensa e sente, drena a nossa energia e a nossa verdadeira identidade. Não se trata de silenciar o que os outros pensam e suas expectativas. É sobre acolher e permitir as diferenças.

Sei que somos tomados por uma enorme insegurança quando pensamos no futuro dos pequenos, e é este exato pensamento que rege grande parte das nossas atitudes e decisões.

É por essa insegurança que não acolhemos, que não ouvimos e que queremos controlar. A insegurança é apenas uma ferramenta de controle, e não de conexão.

Acredite, o caminho será construído à medida que nos disponibilizamos a questionar a crenças impostas, a aprender e a confiar.

Mulher, mãe, seja sempre a sua melhor amiga. Não escolha estar acompanhada de amizades tóxicas, de ficar perto de quem a anula. Escolha a felicidade em primeiro lugar e seja a pessoa Fantástica que você é!

*Mariana Wechsler, Educadora Parental, especialista em educação respeitosa, budista há mais de 34 anos e formada em Comunicação. Mãe de Lara, Anne e Gael. Escreve sobre parentalidade consciente, sobre os desafios da vida com pitadas de ensinamentos budistas e suas experiências morando fora do Brasil, longe de sua rede de apoio. Acredita que as mães precisam aprender a se cuidar e se abraçar, além de receberem apoio e carinho. Sempre diz: “Seja Fantástica! Seja sempre a sua melhor amiga”.

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