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5 razões que explicam porque as redes sociais não são brincadeira de criança

Segundo pesquisa da CETIC.br, no Brasil 82% das crianças e adolescentes utilizam as redes sociais, aproximadamente 22 milhões de crianças entre 9 e 17 anos

Adriana Drulla* Publicado em 14/03/2021, às 00h00 - Atualizado às 10h00

Alerta: Meninas usam redes sociais mais do que meninos, e são mais vulneráveis a seus malefícios como automutilação e depressão
Alerta: Meninas usam redes sociais mais do que meninos, e são mais vulneráveis a seus malefícios como automutilação e depressão

Se você já foi adolescente, sabe que é um período conturbado. A adolescência é uma fase de mudanças cerebrais e sociais que aumentam a vulnerabilidade para o desenvolvimento de patologias como depressão e ansiedade. Segundo relatório do Ministério da Saúde publicado em 2018, 60% dos adolescentes que passaram em consulta médica relataram sintomas depressivos.

A saúde mental, ou a ausência dela, é resultado de um processo multifatorial. É impossível apontar um único vilão. Porém, é fato que os números pioraram expressivamente a partir de 2009 e 2010, quando as redes sociais se tornaram populares entre as crianças e adolescentes.

Twenge estuda dados sobre o comportamento de adolescentes americanos desde a década de 70. Ela alerta que meninas usam redes sociais mais do que meninos, e são mais vulneráveis a seus malefícios. Este é um dos motivos que a pesquisadora aponta para o fato de que triplicaram as internações por automutilação entre meninas de 10 a 14 anos no período de 2009 a 2015. A depressão aumentou em 60% na faixa etária de 12 a 19 anos entre 2009 e 2017.

Segundo pesquisa da CETIC.br, no Brasil 82% das crianças e adolescentes utilizam as redes sociais, aproximadamente 22 milhões de crianças entre 9 e 17 anos. Nos Estados Unidos, 90% dos adolescentes entre 13 e 17 tem perfis nas redes. Um mercado multimilionário.

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A questão é que a regulação governamental e responsabilidade social das empresas anda bem atrás da ciência. A indústria de tabaco é um caso clássico – o movimento regulatório começou muitas décadas depois dos malefícios do cigarro estarem comprovados. Falando sobre os efeitos das redes sociais, Sean Parker, primeiro presidente do Facebook, desabafou “sabe Deus o que isso está causando nos cérebros das nossas crianças”. A ciência começa a desvendar os prejuízos. Conheça 5 deles.

Redes tornam adolescentes mais influenciáveis

Adolescentes estão se preparando para a vida independente, então construir laços para além da família é fundamental nesta fase. É natural que a aprovação e feedback do grupo influenciem os comportamentos do adolescente. No entanto, antes das redes sociais, precisávamos sair de casa para encontrar a aprovação ou reprovação dos amigos. Existia um tempo de reflexão individual. Hoje, os adolescentes recebem estes sinais o tempo todo.

Outro fator importante é que na comunicação offline você precisa refletir sobre o que os outros estão pensando. Nas redes, isso não é necessário – o número de likes e seguidores deixa claro o que é desejável. Quando batem o olho em uma foto ou um perfil, os adolescentes já sabem o que devem fazer ou quem devem ser para serem populares.

Um estudo feito na Universidade da Califórnia, identificou que quando os adolescentes viam fotos com muitas curtidas, áreas do cérebro relacionadas à memória, imitação e reforço de comportamento ficavam mais ativas. Quando as fotos com muitos likes envolviam comportamentos como fumar maconha ou beber, havia uma redução de atividade na área cerebral relacionada ao controle de impulsos. Acrescente a isso o fato de que adolescentes ainda não tem um autoconceito e identidade formados. Ou seja, temos a receita certa para que eles se tornem mais influenciáveis e manipuláveis.

As redes provocam o vício

Sean Parker, o primeiro presidente do Facebook, declarou que a ferramenta foi desenhada para explorar a vulnerabilidade psicológica humana, já que em cada curtida ou interação positiva, nosso cérebro produz dopamina, um hormônio relacionado ao prazer que é altamente viciante. A dopamina está envolvida no vício em redes sociais, e diversos outros vícios como drogas e jogos.

Um outro fator fundamental para o vício é a velocidade em que os usuários recebem o reforço. Quanto mais rápido vem o reforço, mais viciante é o comportamento. No caso das redes, curtidas são comunicadas em tempo real, a todo momento, nos bolsos dos nossos filhos. É claro que todos nós podemos nos viciar nas redes sociais. Mas as crianças e adolescentes são muito mais vulneráveis. Primeiro porque o cérebro deles ainda está em formação. Segundo, porque nesta fase a aprovação social é naturalmente sobrevalorizada.

Prejudica a autoimagem

Uma das principais tarefas da adolescência é a construção da identidade. Adolescentes são autocentrados porque estão obcecados em descobrir quem são. E para descobrirmos quem somos, olhamos em volta. Comparamos nós mesmos com as outras pessoas para descobrirmos similaridades e diferenças. O problema é que nas redes, o adolescente compara a vida e imagem que tem, com fragmentos das vidas de outras pessoas, propositalmente editados para impressionar.

Antes das redes, falava-se que as modelos magérrimas das revistas contribuíam para a baixa autoestima e problemas alimentares entre jovens. Hoje, são os próprios amigos quem postam essas imagens perfeitas e editadas. Quando os adolescentes criam uma imagem alterada por filtros, edições e recortes, e recebem a aprovação dos pares, eles se sentem motivados a repetir esse comportamento. O problema é que quando a imagem que eles apresentam nas redes não condiz com quem eles veem no espelho, fica mais difícil gostarem de quem são de fato.

Por outro lado, se eles recebem silêncio, cancelamento e comentários maldosos, eles se sentem inferiores e aprendem que precisam ser ou pensar diferente. Eles se tornam mais inseguros e propensos a construírem imagens falsas de si mesmo.

Aumenta sentimentos de solidão

Sherry Turkle, psicóloga social e professora no Massachusetts Institute of Technology, reviu estudos envolvendo 300 crianças e 150 adultos em seu livro Alone Together. Ela constatou que pessoas que dedicam muito tempo para a conexão online, se sentem mais solitárias e isoladas, estão mais desconectadas emocionalmente, mais ansiosas e mentalmente estafadas. O tempo excessivo nas redes sociais reduz o tempo disponível para experiências reais.

Algumas pessoas usam as redes para manterem atualizadas as amizades verdadeiras. No entanto, cada vez mais as pessoas seguem outras que não conhecem, e de quem não são próximas. Amizades virtuais podem gerar uma ilusão de companheirismo, mas o fato é que elas não envolvem o senso de compromisso que existe nas amizades reais. Grupos e amizades virtuais não satisfazem nossa necessidade de pertencimento. Quando a criança está em um dispositivo, ela está de fato sozinha. Além disso, acompanhar a vida dos amigos em tempo real também significa se deparar com fotos de programas para os quais o adolescente não foi convidado, ou momentos em que todos estão se divertindo, menos ele.

Aumenta o risco de bullying e exclusão, principalmente entre meninas

Pesquisas mostram que meninos tendem a exibir a agressividade fisicamente enquanto as meninas o fazem socialmente. Elas agridem as rivais procurando prejudicar seus relacionamentos, status e reputação, por exemplo, usando as redes para se certificarem que as rivais saibam que foram excluídas, ou para fazer comentários maldosos, mesmo que anonimamente. Jonathan Haidt, psicólogo social e pesquisador que tem escrito bastante sobre a questão das redes afirma que “a mídia social é o maior facilitador da agressão social desde a invenção da linguagem, e as evidências disponíveis hoje sugerem que a saúde mental das meninas sofreu como resultado”.

Na mídia, vemos executivos e fundadores das empresas de tecnologia dizendo publicamente que mantém os filhos longe das redes, eles conhecem os malefícios. A maioria deles endorsa o movimento conhecido como “slow-tech parenting”. Manter os filhos longe das redes é um desafio, sobretudo em tempos de isolamento social. Neste ponto, eu concordo com a recomendação de Haidt: se for necessário usar a tecnologia para a manutenção das amizades, as crianças estão mais seguras com as ferramentas de texto ou vídeo conferência.

Em 1977, uma pesquisa da associação das indústrias de tabaco afirmou que “a instalação do hábito de fumar é um fenômeno adolescente”. Quanto mais cedo, maiores chances de que a pessoa fume por 30 anos ou mais. Uma situação semelhante está acontecendo hoje com as redes sociais. Desta vez, quem está pagando o pato são os nossos filhos, os filhos de quem ainda não sabe que redes sociais não são brincadeira de criança. Compartilhe esse alerta.

Adriana Drulla

*Adriana Drulla, mestre em Psicologia Positiva pela Universidade da Pensilvânia e especialista em Parentalidade Consciente


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